Por Milene Moraes
A presença feminina no mercado de trabalho ainda é um tópico recorrente nas discussões socioeconômicas, uma vez que cada avanço representa uma grande conquista em uma sociedade em que o público masculino ainda ocupa majoritariamente o espaço profissional. E isto é ainda mais evidente no mercado industrial, em que a presença feminina corresponde a 30% dos cargos, de acordo com o Ministério da Economia.
Em relação aos cargos de liderança na indústria, por exemplo, apenas 29% são ocupados por mulheres, segundo uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI). A questão salarial não é diferente, uma vez que um levantamento divulgado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), expõe que as mulheres recebem 14,7% a menos do que os colaboradores homens e, tal paridade salarial na indústria deve ocorrer apenas em 2035.
Levando em consideração estes pontos, um dos grandes desafios atuais para as companhias é entender todo o seu ecossistema e materialidade do negócio, expandindo o olhar interno e sendo um agente ativo para superar as barreiras impostas pelo setor. Ou seja, para que recrutadores e a área de recursos humanos tenham a possibilidade de contratar candidatas mulheres em cargos industriais, cabe a todo o setor industrial oferecer as melhores condições de trabalho e diversidade na oferta.
Anteriormente a isso, também é preciso pensar na questão educacional. Socialmente, o estímulo ou inspiração para jovens mulheres seguirem os estudos na área de ciência, engenharia, tecnologia e matemática, embora venha melhorando, ainda é muito escasso. Além da falta de incentivo, também há a influência histórica de décadas, do estereótipo de que meninos são melhores que meninas nas áreas de exatas, o que leva a uma associação destes campos de estudo com as habilidades do gênero masculino.
Isto é irreal e pode ser comprovado quando analisado o reconhecimento de mulheres de tais áreas que ocuparam lugares de destaque em diversas premiações ao longo dos anos, como o Prêmio Nobel. A física e química polonesa, Marie Curie, a física teórica estadunidense, Maria Goeppert-Mayer, a física canadense, Donna Strickland, e a engenheira química estadunidense, Frances Arnold, são apenas alguns dos nomes femininos de peso ao redor do mundo que já quebraram essa barreira.
Porém, estes fatores estereotipados influenciam diretamente a probabilidade de mulheres cultivarem seu próprio interesse por profissões relacionadas a área industrial e de seguirem carreira no setor, refletindo, posteriormente, nos números de adesão de mulheres ao segmento industrial e, por consequência, na representatividade feminina em cargos de liderança.
Com tantos desafios precedentes à inserção no mercado, ainda existem as barreiras a serem vencidas durante a consolidação da representatividade das mulheres na indústria, como a dupla jornada de trabalho que muitas mães enfrentam durante sua carreira, a qual muitas vezes leva à exaustão, especialmente quando não suportadas e asseguradas pelo ambiente de trabalho.
A importância das mulheres na indústria
Desde a 1ª Revolução Industrial, no final do século XVIII, as mulheres fazem parte do mercado de trabalho, quando tiveram que trabalhar para sustentar as famílias enquanto os homens estavam na guerra e as fábricas precisavam de mão de obra. Dessa forma, a presença feminina foi inserida na indústria. Passadas três Revoluções Industriais e estando a 4ª em pleno desenvolvimento, a presença das mulheres na indústria ganhou ainda mais importância.
Isto porque, investir na contratação de mulheres tem se mostrado uma opção cada vez mais assertiva às fábricas, não apenas porque gradativamente mais mulheres estão se candidatando às vagas e preenchendo requisitos necessários, mas também porque os empregadores têm percebido a importância de quebrar antigos paradigmas. Além disso, dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) apontam que companhias com maior pluralidade de gênero podem gerar cerca de 20% a mais de lucro, enquanto lideranças femininas garantem resultados até 20% mais proveitosos.
As mulheres oferecem características bastante positivas no ambiente industrial, como a capacidade de gestão, organização, alto nível de motivação e autonomia, além de apresentarem maior habilidade em visualizar, comunicar e ter empatia.
Sua maior predisposição para a comunicação e feedback contribuem para a resolução de conflitos, bem como incentivam a formação de equipes e otimização das tomadas de decisão. Além do mais, a maior parte das mulheres também tendem a se concentrarem em diferentes assuntos e realizarem várias tarefas ao mesmo tempo, podendo gerar inovação e impulsionar os negócios.
Sendo assim, o avanço e desenvolvimento das pautas sociais junto com a globalização e o progresso tecnológico sustentam cada vez mais um novo processo organizacional na cadeia de produção industrial. Segundo um estudo do Mckinsey Global Institute, a promoção da igualdade de condições de trabalho acarretaria em um incremento de cerca de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Porém, atualmente, apenas seis em cada dez indústrias brasileiras contam com programas ou políticas de promoção de igualdade de gênero, de acordo com a CNI.
Neste cenário, apesar de lento e gradativo, é possível vislumbrar cada vez mais um espaço maior para participação da mulher no mercado de trabalho. Ainda há um longo caminho para atingir o mundo ideal de um ambiente diverso e inclusivo, mas essas mudanças são totalmente possíveis de serem realizadas por meio da transformação cultural e da criação de políticas mais inclusivas dentro das organizações.
Ao introduzir mais mulheres no mercado de trabalho industrial existe a possibilidade de cada vez mais inspirar jovens mulheres que ainda não decidiram qual área de carreira gostariam de seguir. A presença feminina na indústria também é essencial para construir um ambiente mais inclusivo e diverso, levando em consideração todas as perspectivas dos indivíduos nas tomadas de decisão, principalmente a perspectiva feminina, que contém desafios singulares.
Portanto, para tornar o mercado industrial mais inclusivo, as empresas devem enxergar cada vez mais as mulheres como peças-chave no mercado, a fim de aumentar seu quadro feminino e alcançar metas de igualdade de gênero. Com práticas inclusivas, programas de capacitação e estímulos que incentivem a inserção de mulheres na indústria, será possível gerar um mercado de trabalho mais resiliente, no qual competências e habilidades femininas serão tão valorizadas quanto devem ser.
Milene Moraes é Head de Recursos Humanos Latam na Fluke do Brasil, companhia líder mundial em ferramentas de teste e medição presente em diversos segmentos da indústria.