A reabertura das lojas físicas após a pandemia não conteve o crescimento do e-commerce no Brasil. O setor mantém projeções de alta para os próximos anos. A estimativa da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm) é de que as lojas online faturem mais de R$ 185 bilhões em 2023.
Os novos hábitos de compra dos brasileiros fizeram crescer também o número de reclamações nos serviços de proteção. Entre as principais queixas nos Procons estão os atrasos ou não entrega das mercadorias, cobranças indevidas, má qualidade dos produtos e vendas feitas por sites falsos.
Mestre em Direito com experiência em defesa do consumidor, Eros Belin de Moura Cordeiro explica que existe uma diferença essencial na proteção de clientes que optam por compras online: o direito de arrependimento. “Isso ocorre porque, nas compras pela internet, o cliente não tem acesso direto ao produto, o que dificulta a avaliação e eventuais testes”, diz o professor do curso de Direito do UniCuritiba – instituição que integra a Ânima Educação, o maior ecossistema de ensino superior privado do país.
O direito ao arrependimento é concedido com base na situação de vulnerabilidade dos clientes do comércio eletrônico e está previsto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor.
O texto diz que “o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar da sua assinatura ou do ato do recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou em domicílio”.
Eros explica que a devolução do produto ou desistência da compra não implicará em penalização ou custos ao consumidor insatisfeito. “Pelo contrário, ele tem o direito efetivo de receber de volta todo o valor gasto com a aquisição do produto ou serviço.”
Cuidado nas compras online
15 de março é o Dia Mundial do Consumidor, considerado a Black Friday do primeiro semestre. O varejo está otimista com as vendas, em especial o e-commerce, mas os consumidores devem redobrar a atenção contra possíveis golpes.
“Nas compras online é fundamental checar a confiabilidade do site, pesquisar as avaliações e as reclamações de outros clientes, checar a identificação dos vendedores nas plataformas de marketplace e ficar atento às ofertas para não ser enganado ou lesado”, ensina o professor Eros Cordeiro, docente no curso de Direito do UniCuritiba.
O especialista lembra ainda que o comércio eletrônico segue regras estabelecidas no Decreto 7962/2013, uma legislação complementar ao Código de Defesa do Consumidor. “O decreto trata, efetivamente, das normas do comércio eletrônico e da proteção dos consumidores que se utilizam da internet para fazer suas compras.”
Serviços de defesa e proteção
Os consumidores lesados têm algumas formas de reivindicar seus direitos. Uma alternativa é fazer a reclamação formal no Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) da própria empresa. Fazer o registro da insatisfação e documentar a tentativa de solucionar o problema junto ao vendedor é o primeiro passo.
Em caso de demora na resposta ou recusa na solução, o consumidor tem outros caminhos: o Procon ou a Justiça. Bacharel em Direito, Eros Belin de Moura Cordeiro diz que o Procon tem poder para multar e promover a conciliação entre consumidores e vendedores.
“A judicialização também é um recurso e não depende, necessariamente, de uma reclamação prévia ao Procon. Quando o consumidor se sente extremamente lesado, pode recorrer ao Juizado Especial ou às varas cíveis especializadas. No caso dos Juizados Especiais, para causas com valor inferior a 40 salários-mínimos, o cidadão não tem custas processuais”, diz o especialista.
Avanços na proteção ao consumidor
O comércio é o terceiro setor em número de reclamações no Brasil, perdendo apenas para as telecomunicações e o sistema financeiro, segundo aponta o levantamento Consumidor em Números, divulgado pela Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon).
No Paraná, a tendência se confirma. Segundo o Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), que reúne dados dos Procons municipais, mais de 2,4 mil atendimentos já foram realizados no estado neste ano. Em 71,21% dos casos os consumidores formalizaram uma reclamação ou denúncia.
Os assuntos financeiros lideram o ranking de atendimentos (36,94%). No caso de reclamações, a campeã é a telefonia celular, que corresponde a 12,63% das queixas, seguida pelos bancos (10,15%).
Entre os problemas mais reclamados pelos consumidores paranaenses estão cobranças indevidas ou abusivas (22,96%), ausência de resposta do SAC, incluindo excesso de prazos e não suspensão imediata da cobrança (10,81%) e produto com vício (5,26%). As avarias correspondem a 3,75% das queixas e o não cumprimento de contratos a 2,45%.
Lei não protege apenas o cliente
A velha máxima de que o cliente tem sempre razão não é uma verdade absoluta. Segundo Eros Cordeiro, o consumidor tem seu direito assegurado sempre que o vendedor ou fornecedor não cumprir com promessas ou metas de desempenho e qualidade de um produto ou serviço.
“Há casos em que o consumidor não poderá se prevalecer dessa falsa ideia de ter sempre razão. Se a empresa comete um equívoco ou erro de digitação em um folder ou publicidade, por exemplo, o cliente não pode simplesmente se aproveitar disso para comprar um produto sabidamente abaixo do valor real”, comenta o especialista.
Ainda assim, avalia Eros Cordeiro, o Código de Defesa do Consumidor trouxe importantes ganhos e garantias. “A lei não protege exclusivamente o consumidor e elevou o padrão e a competitividade do mercado brasileiro graças às regras sobre a qualidade dos produtos e serviços.”
As punições para propaganda enganosa e abusiva ou as regras de transparência nos contratos são outros pontos positivos. “O Código de Defesa do Consumidor é primoroso em mecanismos de proteção coletiva. Tivemos um avanço na efetividade dos direitos, tutela mais rápida aos consumidores, melhoria na estrutura dos Procons e criação de mecanismos mais céleres para a resolução de conflitos”, finaliza.