Ler a maioria dos jornais brasileiros, americanos e europeus é fazer uma descoberta surpreendente: parece que não existem mais partidos ou políticos de esquerda.
Todos os partidos e políticos de esquerda agora são chamados de “centro” ou “centro-esquerda”.
Acabaram também as forças políticas de direita. Agora, quem não é de esquerda é automaticamente chamado de extrema-direita.
Isso é uma pirueta ideológica absurda, incompatível com o verdadeiro jornalismo e com o que mostra a história.
Vamos explicar:
O mundo é hoje dividido entre duas visões de organização política, econômica, social e moral da sociedade: a esquerda e a direita.
Nas democracias modernas, a esquerda é formada pelos comunistas, socialistas e social-democratas.
Nessas democracias, a direita é formada pelas forças que se opõem à esquerda: conservadores, liberais e libertários.
E os extremos?
A extrema-esquerda é formada pelos elementos radicais de esquerda, que também são socialistas ou comunistas.
A diferença entre a esquerda e a extrema-esquerda não é de natureza, é de intensidade. Dizendo de outra forma: a extrema-esquerda quer exatamente as mesmas coisas que a esquerda – partido único, ditadura do proletariado, fim da propriedade privada, coletivização e estatização da economia. A diferença é que, enquanto a esquerda obedece – mais ou menos – às regras do jogo democrático (até chegar ao poder, claro) a extrema-esquerda pratica abertamente diversas formas de violência, como ameaças a opositores, distúrbios de rua, “ocupações”, assassinatos, terrorismo e guerrilha (o enfrentamento armado ao Estado).
Mas a diferença entre a direita e o que se convencionou chamar de “extrema-direita” não é de intensidade, mas de natureza. É fácil constatar isso: a direita moderna é formada por conservadores, liberais e libertários. Todas essas correntes de pensamento têm como foco o indivíduo. Todas elas consideram os direitos à vida, à liberdade e à propriedade como direitos naturais sagrados. Todas pregam um Estado enxuto, cuja função principal é garantir os direitos do indivíduo e interferir o mínimo possível na vida e na iniciativa privadas. Isso é exatamente o oposto do que pregam as ideologias chamadas de “extrema-direita”: fascismo e nazismo.
Isso leva muitas pessoas a perguntar como fascismo e nazismo podem ser “de direita” se o seu ideário – totalitário, ultraviolento, coletivista e adorador do Estado – nada tem a ver com o ideário dos conservadores, liberais ou libertários que formam a direita.
Isso leva pensadores a questionar se fascismo e nazismo têm, realmente, algo a ver com a direita, ou se são, na verdade, simples variantes do totalitarismo de esquerda. Por exemplo, no seu livro “Sobre Moeda e Inflação”, o economista Ludwig von Mises se refere ao “nacional-socialismo” como “a versão alemã do comunismo”[1].
Essa linha de argumentação encontra sustentação em elementos inquestionáveis: as inúmeras semelhanças entre as doutrinas fascista e comunista; o passado socialista de Mussolini, o líder italiano inspirador do fascismo; e o fato histórico, facilmente comprovável, de que nazismo é uma abreviatura do termo alemão que significa “nacional-socialismo”, ou socialismo nacional. O nome completo do partido nazista alemão era Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães. O nome diz tudo. Por que algum partido se denominaria socialista, se não o fosse?
Confirmações dessa tese vêm de locais improváveis, como o livro Regras Para Radicais, do ativista americano de esquerda Saul Alinsky, guru de toda a esquerda moderna. Alinsky admite que “alguns grupos da extrema-esquerda foram tão longe no círculo político que se tornaram indistinguíveis da extrema-direita[2]”. Exatamente: isso acontece porque a “extrema-direita” é, na verdade, uma mera variante da extrema-esquerda.
É fácil perceber os inúmeros pontos em comum entre os regimes comunistas e fascistas: glorificação do Estado, desprezo pelo indivíduo e seus direitos, coletivização forçada, partido único e uso da violência – campos de concentração, tortura, tribunais de exceção, assassinato de opositores – como instrumento de ação política. A única diferença entre o fascismo e o comunismo é que o fascismo mata em nome da “raça” enquanto o comunismo mata em nome da “classe”.
Para quem é assassinado, isso não faz diferença alguma.
O confronto entre comunismo e fascismo, segundo a opinião de muitos, longe de representar um conflito entre ideologias opostas, seria apenas a disputa monstruosa entre dois regimes totalitários assassinos, competindo pelo monopólio do poder[3]. É um fato histórico a aliança entre comunistas soviéticos e nazistas alemães no início da Segunda Guerra Mundial. Através da assinatura do pacto Ribbentrop-Molotov comunistas e nazistas dividiram a Europa entre eles. Vale lembrar que o pacto foi finalmente violado pela Alemanha. Se dependesse dos comunistas, a aliança com os nazistas teria perdurado até hoje.
Fascismo não é o oposto, e muito menos o contrário, do comunismo; na verdade, é sua alma gêmea. Fascismo e comunismo são monstros gerados do mesmo ovo de serpente. Ambos têm o mesmo objetivo; colocar no poder um pequeno grupo que goza de poder absoluto, enquanto a maioria da sociedade é reduzida à servidão e à pobreza mais absoluta.
Fascismo e nazismo nada têm a ver com o pensamento da direita moderna – o pensamento liberal de Hayek e Mises, o pensamento conservador de Burke e Kirk ou as ideias libertárias de Walter Block e Hans-Hermann Hope. Ao contrário: os maiores oponentes dos regimes totalitários, nos dias de hoje, são exatamente os liberais e os conservadores (no campo político, principalmente esses últimos).
Repetindo: as pautas principais da direita moderna são a defesa da liberdade, da autonomia e da independência do indivíduo, a defesa dos direitos naturais – principalmente direito à vida, à propriedade e à autodefesa – e a rejeição a todo tipo de tirania e coletivismo. Portanto, diz a lógica mais básica, nenhum movimento político que viole esses princípios pode ser considerado “de direita”. Por definição, não existe liberal ou conservador extremista.
Por isso, da próxima vez que um comunista usar os crimes do fascismo para atacar a direita, explique isso a ele: fascismo nada tem a ver com direita. Fascismo é um regime totalitário nascido da costela do comunismo, ao qual está ligado por ideias, políticas, líderes e crimes.
Fascismo, nazismo, comunismo e socialismo são ideologias totalitárias, promotoras do extremismo, do atraso e da miséria, nascidas no mesmo berço e que pertencem à lata de lixo da história.
Como disse Francis Fukuyama em um recente artigo para o The Wall Street Journal, “todos os anos, centenas de milhares de pessoas – às vezes milhões – deixam países pobres, violentos e mal-governados em busca de uma vida melhor. Seu destino de escolha nunca é a China, a Rússia ou a Venezuela. Em vez disso, eles procuram sociedades liberais bem governadas, onde seus filhos terão maior liberdade e oportunidade[4]’.
[1] Mises, Ludwig v.; Sobre Moeda e Inflação, LVM Editora, 2017, p.116.
[2] Alisnky, Saul. Rules for Radicais, Vintage Books, 1989, p.xxii.
[3] Uma descrição da catástrofe que resulta desse embate pode ser encontrada no livro Berlin 1945, que descreve os últimos dias da Segunda Guerra Mundial, quando o Exército Vermelho da União Soviética invadiu a Alemanha e ocupou Berlin.
[4] https://www.wsj.com/articles/the-long-arc-of-historical-progress-11651244262?page=1
Texto de Roberto Motta, Engenheiro Civil pela PUC-RJ, Mestre em Gestão pela FGV-RJ e tem cursos do programa de MBA da George Washington University. Roberto tem mais de 30 anos de experiência como executivo em grandes empresas, incluindo 5 anos como consultor do Banco Mundial nos EUA. Conheça as obras do autor!